É isso mesmo?? Sim, você não se equivocou quando leu o título desta matéria. É possível a desconsideração INVERSA da personalidade jurídica no ordenamento jurídico pátrio e sua aplicação por nossos tribunais é cada vez mais difundida, não sendo mais relevante questionamentos acerca da possibilidade de sua utilização.
Tem-se como exemplo prático e corriqueiro no dia a dia do Judiciário brasileiro o fato do sócio da pessoa jurídica, exercendo suas atividades em caráter particular, promove o esvaziamento do seu patrimônio e o transfere para a pessoa jurídica com o intuito de furtar-se ao cumprimento de suas obrigações pessoais. Assim, não possuindo patrimônio pessoal a ser executado, o sócio continuaria a usufruir dos bens da pessoa jurídica como se sua propriedade fossem.
Em casos como estes, aplica-se da teoria da desconsideração inversa da personalidade jurídica da empresa a partir da interpretação extensiva do comando previsto no artigo 50 do Código Civil, onde se advoga a tese de que, uma vez sendo possível utilizar-se do patrimônio dos sócios/administradores para responder pelas dívidas da sociedade, nada mais justo do que, inversamente, utilizar-se do patrimônio da sociedade para saldar dívida pessoal dos sócios/administradores.
Somando-se a isso, o Código de Processo Civil, através do parágrafo 2º do artigo 133, veio chancelar o entendimento construído jurisprudencial e doutrinariamente, positivando expressamente a teoria da desconsideração inversa da personalidade jurídica, quando afirma que “aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica”.
Vê-se, portanto, que tal instituto foi criado para casos em que o devedor esvazia o seu patrimônio pessoal, transferindo os seus bens para a titularidade da pessoa jurídica, em flagrante abuso da personalidade jurídica, desvio de finalidade ou confusão patrimonial.
Cabe registrar que o âmbito de aplicação da desconsideração inversa não se restringe às relações comerciais. Na verdade, a sua aplicabilidade vai muito mais além, sendo cabível em todas as relações jurídicas que possam ser afetadas pelas fraudes realizadas utilizando-se da personalidade jurídica como blindagem patrimonial.
A desconsideração da personalidade jurídica configura-se como medida excepcional. Sua adoção somente é recomendada quando forem atendidos os pressupostos específicos relacionados com a fraude ou abuso de direito estabelecidos no art. 50 do CC/02, podendo o juiz, a partir daí, no próprio processo de execução, levantar o véu da personalidade jurídica para que o ato de expropriação atinja os bens da empresa.
A partir da nova disposição processual, restou encartado em nosso ordenamento jurídico os procedimentos inerentes ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, deixando, assim, de ser ato discricionário do juízo, respeitando-se, por conseguinte, os princípios da isonomia, segurança jurídica, igualdade e ampla defesa.